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Trecho do Livro:

A Segunda Expedição Contra Pau de Colher

Logo depois do insucesso de Vieirinha em acabar de vez com o reduto fanático, os jornais de todo o país noticiaram o foto de insurreição na Bahia, culpando o beato José Lourenço. O governo Vargas através do seu Ministro da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra autorizou às polícias do Piauí, Ceará, Pernambuco e Bahia a enviarem homens para acabar logo com a insurreição. Temendo que o fenômeno Canudos, viesse a se repetir de novo. O governo do Piauí preparou uma tropa compsta de 29 soldados e um sargento contra Pau de Colher. A notícia chegou até as fronteiras do Piauí com a Bahia e espias de Pau de Colher, em Lagoa do Alegre, souberam da aproximação dos soldados e correram para avisar ao Quinzeiro.

Quinzeiro convocou o povo à praça. Ao seu lado estava a velha Gracinha, que comandava um grupo de mulheres caceteiras, muitas delas sabiam atirar o cacete com maestria, além de manejarem bem as armas brancas como facas e machados. Ela era mãe de Pedro Benvenuto - diziam que tinha corpo fechado. Não podia morrer de bala, somente de faca.

Os principais chefes receberam ordens e 60 homens foram escolhidos. Então Quinzeiro, virando-se para eles disse: "- Vão encontrar lá fora. Não deixem eles entrar aqui no meio deste grupo de mulheres, senão o desbadalho não é deste mundo". Quinzeiro já conhecia bem a fúria dos policiais pela experiência que tinha tido no Ceará. A maioria destes homens é contratada entre jagunços e cangaceiros.

Algumas mulheres, armadas de cacetes e facas, ficaram na retaguarda. Possuíam algumas armas de fogo. Entretanto, o armamento principal consistia de facões, foices e cacetes.


O Trajeto da Força do Piauí

Na Bahia, os soldados do Piauí passaram por Lagoa do Alegre, Ouricuri; penetraram dentro da caatinga de Pau de Colher. Todos eles vinham montados em burros e seguiam vacilando pelos caminhos tortuosos e ambívios da serra Dois Irmãos. Não sabiam onde ficava Pau de Colher e, em poucas casas encontradas, não havia ninguém. Os moradores tinham fugido com medo da "guerra", como diziam eles. A tropa não possuía nenhum adminículo local.

A coluna chega até à fazenda Morro, aí deriva por uma vereda de direção leste. A tropa encontra-se somente a menos de uma légua de Pau de Colher. A paisagem da caatinga seca tem a mesma coloração das fardas amareladas onde, em um cinturão preto, pendiam afiadas baionetas. Alguns soltados levavam ainda facas e punhais. Nota-se neles uma certa preocupação. Cada volta, cada atalho e cada subida são como se estivessem caminhando em direção a uma cilada. Na verdade, esta força do Piauí, sem guias e de um certo modo esgotada pelo longo trajeto, era o retrato de um exército vencido, marchando com um desário total. O tenente estava ancipite durante todo o trajeto.

O solo empedrado estremecia com o galopar dos cavalos. A canícula castigava as praças e animais. Com os troncos pendidos para frente e as pernas banhadas em suor que deixava uma mancha úmida na farda amarelada, os soldados avançavam à procura de cacimbas nos pousos dos vaqueiros. Por um momento, a água era mais importante que os "fanáticos" de Pau de Colher. A secura do ar e a temperatura elevadíssima deixaram a tropa exausta e sequiosa.

A Tática de Quinzeiro

Quinzeiro distribuiu seus caceteiros pelos dois lados da estrada, dentro da caatinga; aproximadamente 500 metros do reduto onde se concentrava o terreiro do Senhorinho.

Os piquetes da frente vinham pelo meio da estrada e estavam armados. A tática consistia em iniciar um tiroteio e fazer os soldados desmontarem. Em seguida, eles atacariam de cacete pelos flancos.

De ouvidos colados no chão os vigias de Quinzeiro escutavam a trepidação do solo e contavam o número de léguas em que se encontrava a pequena coluna.

Existia uma cacimba velha próxima, à estrada , com uma cerca ao redor. Atrás dela ficaram alguns lutadores. Às 14 horas e 30 minutos, os soldados, aproximaram-se. Alguns animais relincharam, talvez percebendo o inimigo entrincheirado ou presença de água. O sol dardejava a pino, iluminando o solo coalhado de pedras e cactos. Tinha começo à parte íngreme da serra dos Dois Irmãos. A vertente ocidental, onde se enconsta o reduto, começava a mostrar as massas gnaissicas e atrás delas, entrincheirados, com seus cacetes, dezenas de lutadores, abeirando-se da orla da caatinga, dentro das macegas ou caapões como se fossem espectros, esperando o momento para caírem sobre a tropa.

A luta

Percebendo-se que se encontrava próximo a Pau de Colher e iria pegar os fanáticos de surpresa, o tenente começou a aproximar-se da lagoa, a fim de saciar a sede de homens e animais. Nisto os sertanejos dispararam o primeiro tiro muito mais com a intenção de fazê-los saltar das montarias do que para matar. E isto aconteceu. Pensando que estivessem sendo atacados de frente, os soldados apearam e começaram a amarrar os animais, a fim de reagir aos tiros provenientes da lagoa. Um informante, a Alano Viana, descreve assim a luta: "O mundo escureceu de cacetes. Quando eles viram que se acabavam todos, voltaram para os animais e a confusão se formou. Animal rinchava, animal pulava, animal empinava e eles só conseguiram apanhar 11 cavalos. Nestes 11 animais montaram 29 soldados e desabaram no mundo, pra trás. Tão doidos, os fanáticos, estavam, que nem se lembraram dos 19 animais que estavam juntos a eles. Correram mesmo a pé atrás dos soldados, até uma distância de 2 léguas. Os 29 soldados que iam nos 11 animais foram apiar com uma distância de 12 léguas. Um sargento ficou morto em Pau de Colher". (30)

Quando chegaram à Lagoa do Alegre, feridos, cambaleando, sedentos, vestes rasgadas, sem cartucheiras, traziam na face a derrota sofrida. O retorno foi sem glória. Alguns soldados em desespero, mal conseguiam falar. Tremendo, compulsivamente, tentavam contar o ocorrido. A população alarmada arrumava os pertences para se refugiar nas fazendas próximas.

Pau de Colher, o arraial sedicioso desarmado, estava ganhando a guerra.